terça-feira, 16 de maio de 2017

Morreu o granjense José Porfírio de Carvalho, um herói brasileiro

Faleceu, aos 70 anos, José Porfírio de Carvalho. José Porfírio Fontenele de Carvalho, nasceu em Granja-CE (1946), é considerado um dos maiores indigenistas do país. Ele ingressou nos quadros da Fundação Nacional do Índio (Funai) logo após a criação do órgão, em 1967, o que o levou a quase meio século de intensa atividade, firmando-o como um dos principais nomes da história do indigenismo no país. O antropólogo e ex-presidente da Funai Mércio Gomes escreveu que Carvalho "foi, sem desmerecer outras grandes figuras, o maior indigenista rondoniano de sua geração".

Conheça mais sobre José Porfírio Fontenele de Carvalho através desse belo depoimento de Mércio Gomes, publicado em seu perfil em rede social (https://www.facebook.com/merciogomes/posts/10212336224191932):

"Carvalho, um herói brasileiro
Quem acha que o Brasil é um pobre e desgraçado país de gente sem fé, sem fibra moral e sem destemor é porque não conheceu um dos mais ilustres representantes deste país, José Porfírio Fontenelle de Carvalho, um cearense-piauiense-brasiliense que, neste sábado (13 de maio), nos deixou depois de uma vida intensa, trabalhosa, combativa, cheia de ousadias, correta e, sobretudo, fértil e engrandecedora. Dedicada e produtiva sobretudo para com os povos indígenas com quem ele conviveu, e foram muitos, de todas as partes do Brasil, e à causa indígena pela qual ele nunca perdeu a fé e convicção histórica que o moviam.
Este ano Carvalho faria 50 anos de dedicação à causa indígena. Tendo começado como um simples técnico em contabilidade no Serviço de Proteção aos Índios, em 1967, Carvalho conheceu Francisco Meirelles, numa das suas visitas de fiscalização ao posto de atração dos índios Cintas-Largas, em Rondônia, e sentiu aí um arrebatador chamamento para trabalhar pelos índios, por sua defesa, por sua segurança territorial, por sua integridade humana, por seu futuro. E nunca, em momento algum de sua vida atribulada de indigenista, deixou uma tarefa indigenista a ser cumprida, um índio abandonado à própria sorte, um colega indigenista perdido em suas dúvidas, um presidente da Funai sem uma séria e crítica palavra de orientação.
Carvalho foi, sem desmerecer outras grandes figuras, o maior indigenista rondoniano de sua geração. A terceira geração, se contarmos a primeira como aquela que criou o SPI, em 1910, com o Marechal Rondon, José Vasconcellos, Alípio Bandeira, Pimentel Barbosa, Teófilo Cavalcanti; a segunda, a partir da década de 1940, como sendo a de Francisco Meirelles, Orlando, Claudio e Leonardo Villas-Boas, Darcy Ribeiro e Gilberto Pinto; e agora esta terceira, desde 1968, formada por indigenistas que entraram nos primeiros anos da FUNAI, sob o comando dos militares, a quem essa geração tão bravamente encarou e não vacilou em momento algum, sob pena de perder emprego e ser perseguido, para ajudar aos povos indígenas a se manterem hígidos em seus corpos e em suas almas, e com terras demarcadas. E que geração! Gente como Xará (Ezequias Heringer Filho), Apoena Meirelles, Dinarte Madeiro, Toninho (Antonio Pereira Neto), Aimoré Cunha, só para citar alguns que não estão mais conosco.
As três gerações de indigenistas brasileiros de origem republicana e inspirados nas ideias e sentimentos do Marechal Rondon deixaram um legado de lutas, dedicação ímpar, quase heroica, sacrificada pessoalmente, e alguns importantes resultados. Terras: 13 por cento do território brasileiro estão demarcados como terras indígenas. Demografia: desde os anos 1960 os povos indígenas vêm crescendo em população e hoje somam mais de seis vezes o que eram na década de 1950, cerca de 700.000. Identidade étnica: apesar das fortes pressões e das atrações insidiosas da sociedade de consumo brasileira, mais de 240 etnias permanecem indígenas em identidade e em cultura.
Terras, demografia e identidade são os três pilares da ação indigenista praticada no Brasil. Carvalho foi fundamental na realização dessas tarefas para dezenas de povos indígenas. Um breve rascunho, a ser completado com mais cuidado, de suas ações podem ser vistas neste momento apenas pela memória de alguém que foi seu amigo leal e admirador incondicional: 
1. Demarcação de cinco terras indígenas dos Guajajara (1976-1980)
2. Demarcação de três terras indígenas dos Canela (1976-1980)
3. Demarcação ao longo dos anos de diversas terras indígenas dos Krikati, Gavião-Pukobye, Parakanã, Asurini do Trocará, Waimiri-Atroari.
4. Contribuição fundamental para a reunificação, ou re-etnização, de diversos povos indígenas no Acre, cujos indivíduos viviam espalhados em seringais, fazendas e arrabaldes (1975-1977)

Carvalho deixou sua marca de indigenista e sua influência moral em diversas partes do Brasil por onde trabalhou. Os índios sabiam que podiam confiar nele, e o sabiam por claras razões de trabalho, lealdade e cumprimento do dever. Os colegas indigenistas conheciam o seu caráter moral inabalável, e lhe reconheceram a liderança ao elegerem-no presidente da Sociedade Brasileira de Indigenismo (SBI), em 1979, que surgiu no crucial período dos “coronéis” que presidiam a FUNAI e que tencionavam realizar na prática a retirada da responsabilidade do Estado pela questão indígena – algo que estamos vendo ressurgir por esses dias. Em razão de sua militância pelo indigenismo, como de resto a militância de outros colegas, Carvalho e diversos indigenistas foram demitidos pela FUNAI. Na primeira oportunidade de anistia ou de abertura, nenhum deles hesitou em regressar aos quadros do órgão, pois a esperança de dias melhores para os índios não desvaneceu de seus corações.
Carvalho nos deixa em consequência de um câncer que primeiro o acometeu em 1984, que dele se curou sem nunca sentir medo da morte, e por isso viveu mais uns bons 33 anos cheios de vivacidade e esperança, carregado com uma capacidade obstinada de lutar pelo que achava valoroso e digno para os índios e para o Brasil.
Por isso ele é digno de ser um herói brasileiro.
Aos amigos fica a saudade e o exemplo sempre a nos iluminar; à sua esposa, Maria José, seus filhos queridos Maria José, Jonas, Janete e Porfírio, resta-nos nos consolarmos juntos pelo tanto que ele nos deu de amor, solidariedade, inteligência, dedicação e paz."  
Mércio Gomes 


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